Superar visões estereotipadas que tentam esconder a vida real da Amazônia e seus povos é um dos desafios que a Rede Eclesial Pan-Amazônica – REPAM, tenta responder. Para isso, é necessário que os povos tomem a palavra, pois “a melhor maneira de comunicar a defesa da Amazônia é ouvir seus protagonistas”, segundo Rocío Huamancondor, da Associação Latianoamericana de Educação e Comunicação Popular – ALER.
O eixo de comunicação da REPAM está sendo um nexo de união que nos últimos anos tenta articular o trabalho de diferentes meios de comunicação e instituições, muitos deles ligados com a Igreja, que tentam recolher as vozes da Amazônia, sabendo que “a comunicação Pan amazônica tem seus próprios caminhos, tempos e maneiras “, como afirma Huamancondor. Nesse sentido, podemos dizer que a mídia comunitária local ajuda a conhecer as experiências que têm como protagonistas os povos, contrapondo-se à informação da grande mídia, cujo discurso responde aos interesses globais.
O Sínodo para a Amazônia revelou que a Igreja está colocando em foco a defesa da Amazônia, algo que até agora ninguém tinha feito, em opinião de Maria Rosa Lorbés Iñiguez, do Observatório Sócio Eclesial da Universidade Antônio Ruiz de Montoya, quem destaca o esforço da Igreja para comunicar a realidade da Amazônia, embora reconheça que ela não está indo bem. Esta afirmação é sustentada pelo fato de que os meios da Igreja, inclusive na Amazônia, “reproduz questões rituais, doutrinárias, que nada têm a ver com a realidade de nossos povos”, de acordo com Pepe Mármol, SIGNIS ALC.
É necessário que os meios de comunicação “façam possível que as cosmovisões sejam interpretadas a partir da voz e visão dos povos, não do que nós dizemos”, insiste Maria José Centurion, também de SIGNIS ALC, que vê necessário “que a Igreja coloque o microfone aos povos”, porque ela distingue entre a Igreja que está no território e outra Igreja que nem sempre está aberta para quem mora na região amazônica.
Nesse sentido, como aponta José Ignacio López Vigil, de Radialistas Apaixonadas e Apaixonados, “a base do problema está em compreender o que é a evangelização, que não pode ser uma tentativa de converter, e sim ouvir as pessoas e fazer um diálogo evangélico, que não quer converter naquilo em que acreditamos, que não impõe “.
Em linha com as ideias do Papa Francisco, “a Igreja precisa ser mais ousada, sair de nossas quatro paredes, com foco nas áreas onde os atores estão, para falar a partir da cultura dos povos”, de acordo com Monica Villanueva, de SIGNIS ALC, que afirma que “a Igreja na Amazônia faz muito, mas não se torna visível”. Ouvindo estas afirmações, vêm à minha mente as palavras de Raphael Ch Monthienvichienchai durante uma reunião internacional cujo tema era “O projeto pastoral da Evangelii Gaudium”, realizado no Vaticano em setembro de 2014, onde ele disse que “o que não é conhecido, não existe”, fazendo um chamado à Igreja para tornar conhecidas realidades que muitas vezes estão escondidas ou são distorcidas, como acontece com a vida dos povos amazônicos.
O próprio Papa Francisco, na Laudato Sí, nos pergunta sobre o mundo que queremos construir. Ele insiste na necessidade de aprender com os povos indígenas, que têm uma relação harmoniosa com a natureza, incentivando-nos a construir outro mundo, com outro paradigma de consumo. Como reconheceu Pedro Sánchez, de Iglesias e Minas, referindo-se à presença na Amazônia, é preciso “cuidar da obsessão com o proselitismo, ir para aprender, para ouvir,” pois a evangelização, em sua opinião, “não é ganhar seguidores é sim criar um mundo com os valores do Evangelho”, criticando a atitude de alguns meios da Igreja, “que caíram no proselitismo”.
Essas mesmas ideias foram defendidas por Carlos Ferraro, presidente da SIGNIS ALC, que considera necessário “não ser uma Igreja antiga, que coloniza”. Ao falar sobre comunicação, ele insiste que a comunicação deve ser planejada, fazendo diagnósticos e gerenciamento de comunicação, e que deve se realizar um trabalho de desconstrução em frente à grande mídia. Junto com isso, Ferraro reconhece que a Igreja, com o Sínodo para a Amazônia, teve a coragem de assumir uma questão importante a partir de um conteúdo humano e social.
Daniela Andrade, coordenadora de comunicação da REPAM, não hesita em afirmar que “dentro da Igreja Amazônica ainda existem formas coloniais de ser Igreja, impositivas, de costas para a realidade”. Ela se perguntou “como está a comunicação na Amazônia?”. Portanto, de acordo com a coordenadora de comunicação da REPAM, “o Sínodo pode nos dar o que a evangelização na Amazônia deveria ser hoje”. Para Daniela, “a comunicação não está separada da defesa dos territórios”, insistindo que é necessário “pensar diferentemente sobre a comunicação da Igreja, comunicar o que é a Amazônia, o que o modelo de vida indígena traz ao mundo. Comunicar desde a espiritualidade, que marca a vida política, social e a defesa dos territórios “.
O Sínodo é um momento propício para fortalecer e continuar o trabalho de comunicação entre as diferentes entidades, como ressaltou María Rosa Lorbes Iñiguez, que insiste na necessidade de participar dos debates sobre políticas de comunicação que afetam a Amazônia, especialmente em o que se refere a quebrar as fronteiras tecnológicas, para que a Amazônia possa ter acesso a novas tecnologias, o que exige uma estratégia para criar leis de comunicação que favoreçam as tecnologias de comunicação chegarem a todos os cantos dos países.
Sonia Navas vê a comunicação como “a união dos povos diante de uma política que divide”. Ela insistiu em uma comunicação das bases, para contribuir pouco a pouco. Nessa perspectiva, a Secretária Executiva da ALER ALC, vê o Sínodo como algo que “nos mostrará uma luz sobre as relações da Igreja com os povos”, algo também retomado por Jaime Palácio, para quem “é necessário estar conectado com a base de nossos povos”. Ele vê um desafio na criação de um tecido intermediário, e aponta que há uma crescente concentração populacional nos centros urbanos, onde o trabalho da Igreja também é centrado. De lá, ele chama a atenção para o distanciamento do mundo rural, uma realidade que deve ser acompanhada como Igreja.
A representante da Caritas do Equador, Carina Villacís, reconhece que uma estratégia de comunicação deve se basear nos diferentes atores e nos diferentes públicos. A coordenadora de comunicação ressalta que, no Equador, “os meios de comunicação falam apenas da Amazônia como local de turismo e quando há confrontos”, denunciando “uma tentativa de encobrir a realidade amazônica”. Portanto, é necessário gerar conteúdo que possa tornar visível a realidade amazônica na grande mídia.
Do ponto de vista de REPAM, que procura incentivar um trabalho em rede, Barbara Fraser, salientou a necessidade de criar uma plataforma para discutir a comunicação amazônica, um elemento que reforçou Pedro Sanchez, dizendo que deveria ser um espaço em que se unir comunicadores interessados na Amazônia.
Tudo isso deve nos levar a pensar em uma comunicação onde trabalhemos juntos, a REPAM, a Igreja e os povos, fortalecendo uma rede de comunicadores da Amazônia, com características próprias, baseada em processos construtivos, deixando de lado as visões ocidentais. Isso será possível na medida em que aqueles que vão para a Amazônia sejam sensíveis à ecologia humana, uma necessidade segundo Pepe Mármol, para quem é necessário dar a conhecer “o sofrimento e a dor do povo, estar atento às suas demandas”.
Foto de capa: Arquidiocese de Manaus